Não sou lá de replicar textos "estrangeiros", mas esse cronista do Estadão sempre me chama atenção. Por isso, vou colocar aqui uma preciosidade que encontrei hoje de Lusa Silvestre.
Gente Inteligente Entra em Crise
LUSA SILVESTRE
07 Abril 2015 | 14:36
Pessoas inteligentes vivem se questionando. De vez em quando
até entram em crise. Só os pascácios acham que está tudo sempre bem.
Uma das minhas leitoras, Kátia (o nome não é esse), me
escreve arfante, ansiosa e perdigoteira. Sempre foi a melhor aluna; é
talentosa, bonita (não que eu me importe com isso) e escreve melhor que Clarice
Lispector. Mas tem levado uns olés da vida: perdeu campeonatos, recebeu
críticas e não emplacou canções no Globo de Ouro. Pela primeira vez, está em
crise. Saiu até do Feice. E agora, como faz ? – me pergunta, esbaforida.
Bom, sou brasileiro. De crise eu entendo. Nos últimos vinte
anos passamos por, o quê?, vinte crises – interrompidas por esquisitos períodos
de bonança? Crise é com a gente. Então, posso responder, enquanto brazuca:
calma, Kátia.
Só os beócios acham que está tudo sempre bom. Babam
bovinamente, na alegria e na tristeza. Não se questionam, se contentam com o
pouco que derem. Os inteligentes, os sabidos e os suingados em geral sempre se
questionam. Mesmo quando está tudo azul.
Pra começar, Kátia aparentemente padece da Síndrome
do Moleque Inteligente. Explico: é aquela pessoa que desde a mais suculenta
infância passou pela vivência acadêmica sem dificuldades. Notas boas, elogios
dos professores, entrou na faculdade sem suar o biquini, conseguiu o primeiro
emprego na moleza. Pessoas assim sabem pouco de fracasso – o que é ruim. O
ideal é fazer igual à nossa nação, que cresce calejada e acostumada à
tempestade. A vida é cheia de topadas de dedinho – e quanto antes você se
habituar ao cai-levanta, mais fácil fica.
Crises têm seu lado bom. Melhor ainda se provocarem o choro
desmedido. Li em algum lugar: lágrimas indicam que o cérebro acalmou. Tem a ver
com o hipotálamo – mas não me peça pra explicar direito; minha cultura é a de
Big Brother. Tristeza é normal – embora seja melhor a angústia. Segundo Paul
Ekman (um psicólogo aí), tristeza paralisa, enquanto a angústia movimenta. Ou
seja: o primeiro passo para escalar o fosso é querer sair dele. Tomar
providências, mandar currículo, fazer ajuste fiscal. Só reclamar faz de você
uma pessoa chata – e ainda em crise. Mas tem que usar a cabeça. Não é pra pular
banho achando que está economizando água, como estão fazendo os paulistas
(menos eu).
Pense, querida leitora. Você tem o necessário pra sair
dessa. Aquilo tudo que sempre te fez valiosa: malandragem, jogo de cintura,
neurônios e faca no dente. Vaidade também ajuda, porque os espertos não se
conformam com o buraco; querem sair dali o mais rápido possível. Já os parvos,
não. Acham o fundo do poço suportável porque é fresquinho e quando a pessoa
grita “acuda” vem eco.
Trazendo da sua vida pessoal novamente para o Brasil, Kátia,
esse negócio de gente inteligente versus gente pascácia é mais ou menos como
comparar o nosso país com a Coreia do Norte. Aqui, a gente tem de tudo e acha
que a coisa está super preta (e está mesmo). Lá na Coreia do Norte não tem
democracia, tecnologia, comunicação, dinheiro, comida, liberdade, futebol
decente – mas os caras acham que está tudo joia. Tomam leite de iaque,
imagina. Eles não têm luz elétrica, mas fazem bomba atômica – e isso ilustra
bem como funciona uma mente limitada. Com todo respeito.
Você é igualzinha à nossa nação, Kátia: cheia de recursos
naturais e belezas geográficas. No final, você e o Brasil se levantam. Desde a
primeira missa que dá certo, não vai ser justamente na sua vez que isso vai
mudar. Insista, teime, martele. A gente não desiste nunca.
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